segunda-feira, 6 de abril de 2009

Crise ameaça hegemonia do PMDB

Raymundo Costa e Raquel Ulhôa, de Brasília
DEU NO VALOR ECONÔMICO

Há dois meses no comando do Legislativo, o PMDB atravessa uma crise que ameaça paralisar o Congresso e o bom desempenho do partido nas eleições de 2010. A crise é mais grave no Senado, onde o presidente José Sarney (AP), precocemente enfraquecido, não consegue dar uma resposta definitiva às denúncias que minam a autoridades dos senadores e põem em xeque o modelo patrimonialista de gestão do Parlamento. A sucessão presidencial e nos Estados alimentam um racha que pode desestabilizar de vez a já minguada maioria do governo Luiz Inácio Lula da Silva no Senado.

Em fevereiro, o PMDB conquistou a hegemonia no comando do Congresso, depois de sair também como o grande vitorioso das eleições municipais de 2008. Na Câmara, um acordo com o PT levou à eleição tranquila do deputado Michel Temer (SP) para a presidência. No Senado, o PT se juntou ao PSDB contra a candidatura de Sarney. O pemedebista venceu, mas a eleição deixou sequelas. Nem bem sentou-se na cadeira, Sarney teve de abrir mão de um antigo colaborador: Agaciel Maia, ex-diretor-geral do Senado e dono de uma cinematográfica mansão no Lago Sul, um bairro nobre de Brasília, que não registrara em seu nome.

Daí até a revelação de que o Senado abrigava 181 diretorias, inclusive uma de garagem, foi um passo. A burocracia, fiel a Agaciel e aos próprios privilégios, sentiu-se atacada. Também os derrotados na eleição que Sarney venceu não aceitaram o resultado. Na quinta-feira, quando o Senado conseguiu votar, a duras penas, projetos importantes como a Lei dos Precatórios, uma nova denúncia abalou as bases na quais procurava-se assentar a retomada da rotina: o senador Tasso Jereissati (CE), tucano de primeira linha, usava sua cota de passagens para alugar jatinhos.

Os senadores cobram providências de Sarney, mas também o PMDB se mostra perplexo com a inanição de seu presidente de honra: da atual bancada de 19 senadores, 17 vão tentar a reeleição em 2010 e sentem-se ameaçados pela crise. Mas não só eles. Dois terços das 81 cadeiras do Senado estarão em disputa. A normalidade interessaria, portanto, a todos, mas não é bem assim: a situação saiu de controle. Senadores do PT e do PSDB, por exemplo, anteveem dificuldades para se reeleger e "alimentam o caos", para de alguma maneira tirarem proveito na eleição.

O PMDB, em geral, não vê saída a curto prazo para a crise. O que preocupa o Palácio do Planalto, pois se trata da ala - o grupo do Senado - mais ligada ao governo e já comprometida com a candidatura da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. Além disso, pemedebistas acham que se o presidente da Câmara, não se viabilizar como vice na chapa de Dilma, fica mais difícil a aliança do PMDB com o PT. Isso porque a sorte de Temer ficará nas mãos do ex-governador Orestes Quércia, hoje aliado do governador de São Paulo e eventual candidato tucano a presidente, José Serra. Nunca é demais lembrar que Michel Temer entrou na última vaga de deputado federal por São Paulo, nas eleições de 2006.

O tucano José Serra, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o presidente do diretório do PMDB de São Paulo, Orestes Quércia, têm procurado colocar panos quentes na crise - não interessaria a eles o acirramento da disputa neste momento, quando o PMDB, embora majoritariamente com Lula, ainda não se definiu com relação à sucessão presidencial de 2010.

A crise no Congresso, de fato, pode afetar as alianças eleitorais do próximo ano para presidente, como acreditam alguns senadores. Mas é mais fácil que o contraditório nos Estados determine quem vai com quem na primeira eleição presidencial sem Lula na cédula, desde 1989. Está nas mãos de Dilma, a candidata preferida de Lula, um levantamento segundo o qual há pelo menos cinco Estados em que a união PT-PMDB é considerada "caso insolúvel": São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Pernambuco e Mato Grosso do Sul.

Há dificuldades também em Minas, onde o ministro das Comunicações, Hélio Costa, assumiu a dianteira das pesquisas, mas a cabeça da chapa ao governo é reivindicada tanto pelo ex-prefeito Fernando Pimentel como pelo ministro Patrus Ananias (Desenvolvimento Social). No Rio de Janeiro, o PMDB não abre mão da reeleição do governador Sérgio Cabral, mas o prefeito de Nova Iguaçu, Lindberg Farias (PT), pretende se lançar ao cargo. Até no Pará há dificuldades no relacionamento da governadora Ana Julia (PT) com o cacique pemedebista Jader Barbalho, que pretende voltar ao Senado.

No olho do furacão, o que preocupa os pemedebistas é que até agora não há um disgnóstico claro do que precisa ser feito para reabilitar o Senado com a opinião pública. Nas reuniões da bancada do PMDB, várias propostas são feitas, mas de forma dispersa e sem continuidade. "Há um desnorteamento", diz um integrante da bancada no Senado.

A previsão é que a crise não tenha solução rápida e ponha a perder um projeto que o próprio Lula havia delineado para o PMDB, em 2009, véspera de ano eleitoral: uma repaginação da imagem do partido, corroída por episódios como a disputa renhida por cargos, exemplificada pelas ações do deputado Eduardo Cunha (RJ) nas nomeações para Furnas e seu fundo de pensão, ou o escândalo que levou o senador Renan Calheiros (AL) a renunciar à presidência do Senado, em 2007. Escândalo, aliás, que ainda hoje permeia as disputas no Senado e agrava o desgaste na imagem do PMDB.

Acuado, o PMDB nem sequer recorreu ao "achado" de Temer que permite a ele e a Sarney desafogar as pautas da Câmara e do Senado, independente do "trancamento" provocado por medidas provisórias não votadas. Em vez de "ir para o enfrentamento com a oposição, Temer preferiu esperar por uma palavra definitiva do Supremo Tribunal Federal (STF).

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