domingo, 14 de setembro de 2008

A América Latina, em traumas e repetições


Laura Greenhalgh
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO /ALIÁS


Balmaceda nos remete a Allende, que alerta Morales sobre o caráter resiliente das oligarquias e a sina de presidentes que deixam escapar o momento histórico


Na última quinta-feira, quando a Bolívia contava os mortos de mais um confronto entre apoiadores e adversários do presidente Evo Morales, na capital chilena celebravam-se os 35 anos de um dos golpes mais duros da direita latino-americana: em 11 de setembro de 1973, o Palácio de La Moneda era bombardeado pela Força Aérea chilena e do ataque não sairia vivo Salvador Allende. O presidente socialista preferiu o suicídio a ser capturado pelos militares que lhe negaram lealdade. As celebrações em Santiago até foram pacatas, levando-se em conta que este é o ano do centenário de nascimento de Allende e um país vizinho, justamente aquele que negocia com o Chile uma saída para o mar, anda em pé de guerra. Golpe na Bolívia? Contragolpe? O que virá? Da planície ao altiplano boliviano, ronda o espectro de um Allende sem saída. E o passado volta a incomodar.

Chile não é Bolívia. E Allende não é Morales. Mas o enfrentamento das oligarquias, ao longo da história latino-americana, tem elementos comuns no tempo e no espaço. Essa linha de raciocínio é desenvolvida nesta entrevista por Jorge Edwards, ex-diplomata, um dos maiores escritores chilenos, detentor do Prêmio Cervantes de Literatura. Sua reflexão parte de coincidências históricas, incluindo a de que também falou ao Aliás neste mesmo 11 de setembro. Edwards analisa detidamente a derrubada de dois presidentes chilenos - José Manuel de Balmaceda e Salvador Allende. Ambos foram introdutores de grandes mudanças no país, ao mesmo tempo em que desafiavam as elites locais. Suicidaram-se. Balmaceda em 1891, no rastro de uma guerra civil, Allende em 1973, à portas da ditadura que seria instalada pelo general Augusto Pinochet.

Acrescente-se outra coincidência histórica: o diplomata e abolicionista brasileiro José Nabuco teve imenso interesse pela trajetória de Balmaceda, a ponto de lhe dedicar um longo ensaio, publicado em livro no Brasil (Balmaceda, ed. Cosac Naify, 2008, em coleção organizada por Davi Arrigucci Jr.), cujo prólogo é justamente de Edwards. Contemporâneo de Balmaceda, Nabuco mergulhou na tragédia particular de um presidente à beira do suicídio, algo que de certa forma prefigura a derrocada de Allende no século seguinte. A rigor, o ensaio serve à compreensão do processo de estrangulamento a que presidentes latino-americanos se submetem, como num ritual de auto-imolação, levando-os à morte física e/ou política. Nabuco apresenta duas conclusões sinistras: o caráter de indestrutibilidade das oligarquias e a tendência que a América Latina tem de perder o momento histórico. Edwards não só concorda, como acredita que as conclusões do brasileiro podem se repetir, como profecia macabra, em relação a Evo Morales.

Até a conclusão desta edição, na sexta-feira, a Bolívia vivia perigosamente aos solavancos, a ponto de ser decretado estado de sítio no Departamento de Pando. Manifestantes criavam balbúrdia nos aeroportos, gasodutos estavam sob proteção militar, havia confrontos de rua, a população fazia filas para comprar um botijão de gás, Morales buscou contato com oposicionistas e dois embaixadores americanos, em La Paz e em Caracas, deixavam seus postos na incômoda posição de persona non grata. Eis aqui mais uma coincidência histórica: diplomata em Cuba nos anos Allende, Edwards também foi retirado de Havana por discordar dos rumos da revolução de Fidel. As memórias deste episódio, que remetem aos últimos meses de vida do poeta Pablo Neruda, fecham a entrevista.

Nesta quinta, aniversário do golpe no Chile, a Bolívia vive sob rumores de estado de sítio, golpe...

Antes de mais nada, deixe-me dizer que acabo de passar pelo centro de Santiago e está tudo calmo. Eu me pergunto de onde vem essa tranqüilidade. Há desinteresse do povo ou falta de memória em torno de fatos que aconteceram neste país há 35 anos? Não vejo mais a agitação de anos anteriores, com os partidos de esquerda nas ruas e uma profusão de flores no túmulo de Allende. Hoje escuto discursos formais. Os jovens chilenos que saem às ruas para protestar têm menos que 35 anos. Não viveram o golpe.

Isso tem a ver com o fato de que Pinochet está morto?

Também. Li na imprensa que um grupo de parlamentares de todos os setores, esquerda, centro, direita, trocou abraços numa cerimônia lembrando o golpe. Nesse grupo havia a irmã de um ex-ministro de Pinochet e também o filho de um militante do MIR, que morreu assassinado pela polícia do general. Estavam todos juntos no Congresso, pedindo que o 11 de setembro seja a Data de Reconciliação. Curioso, não? A morte de Pinochet permite coisas assim. Houve até uma missa encomendada por militares na Catedral, onde se rezou pela alma de todas as vítimas. Com o velho general em cena, ele, que era um símbolo vivo do passado e lamentavelmente gerou conflito até o último de seus dias, manifestações pacíficas não seriam assim tão espontâneas.

O senhor atuou no governo Allende e é um estudioso de Balmaceda. Eles tinham traços comuns?

Tinham. Ambos demonstravam grande respeito pelo sistema legal e constitucional do Chile. A prova disso é que Balmaceda se suicidou no dia em que seu mandato presidencial expirava. Esperou até o dia 19 de setembro de 1891 para pôr fim à vida. Salvador Allende, por sua vez, não quis sair vivo do La Moneda, pois sabia que um presidente chileno seria humilhado. E não aceitava essa idéia.

Foram mortes calculadas?

Foram mortes impregnadas de um simbolismo constitucional muito forte. Há um dado curioso: em seus últimos discursos, Allende citou muito Balmaceda. Isso pode indicar que estava prevendo para si mesmo um final parecido com o de seu antepassado político.Outra semelhança entre eles foi a impulsividade. Ambos irritaram o establishment conservador deste país. Digo isso porque, ainda hoje, penso que o Chile é essencialmente um país entre moderado e conservador. Daí termos chegado à conclusão de que era imprescindível construir uma aliança política ampla. É ela que nos viabiliza ainda hoje, mantendo esse entendimento entre esquerda e democracia cristã.

O que o senhor acha do ensaio sobre Balmaceda escrito por Joaquim Nabuco?

Nabuco escrevia para o Brasil. Ele estava interessado nos desdobramentos da guerra civil do Chile, em 1891, procurava ler tudo que saía nos jornais e então fazia análises de cunho conservador para o leitor brasileiro. Era um pensador com idéias colhidas na melhor tradição inglesa, francesa, idéias que interessavam ao Brasil que mal chegava à fase republicana.

Nabuco olhou o saldo da guerra civil chilena e disse que as oligarquias eram indestrutíveis na América Latina. Poderia dizer o mesmo se visse a situação caótica em que a Bolívia se encontra hoje?

Sem dúvida. Mas é preciso deixar claro que as oligarquias bolivianas são separatistas. Autonomistas. São oligarquias agrícolas em conflito aberto com o altiplano, onde o mundo indígena tem expressão forte. São, portanto, mundos em conflitos. Agora, historicamente não há dúvida de que as oligarquias latino-americanas são resistentes e podem recorrer a golpes para salvaguardar seus interesses. Foi o que se deu no Chile. Situações atuais de conflito também têm a ver com a multiplicação dos governos de esquerda na região, como o venezuelano, o equatoriano, o paraguaio, o boliviano. Hoje o Chile não caminha nessa direção porque passou pelo allendismo e sabe suas conseqüências. Ou seja, as ideologias de esquerda não encontram terreno tão fértil em meu país.

O que representa Salvador Allende para o Chile hoje?

Uma estátua. Um símbolo nacional. Allende está mais vivo na Bolívia, no Equador e na Venezuela do que no Chile. Tomemos como ilustração desse fenômeno o ex-presidente Ricardo Lagos, do mesmo partido de Allende. Ambos, socialistas, sendo que Lagos trabalhou no governo Allende. Pois bem, como foi o governo Lagos? Foi o governo que melhor soube negociar com o empresariado. Para criar uma economia que funcionasse - e continua funcionando bem. Os socialistas de agora não são os socialistas de ontem.

E a presidente Bachelet?

Ela leva adiante as linhas traçadas por Lagos. Mas emocionalmente está mais ligada à esquerda histórica, porque Michelle Bachelet viu e sentiu de perto a violência do golpe. Então, em termos político-ideológicos, ela é portadora dos símbolos da esquerda tradicional. Mas em termos práticos, é muito parecida com Lagos. É conciliadora, hábil. O slogan do PS na época de Allende era “avançar sem negociar”. Hoje é “avançar e negociar, sempre”. Estou convencido de que é impossível manter uma ideologia de esquerda no poder com uma economia medíocre. E para que a economia não seja medíocre, há que participar do comércio global, das políticas do petróleo, do consumo para o qual as sociedades estão voltadas, etc, etc.

Tanto Allende quanto Balmaceda eram filhos da elite chilena. Propuseram reformas estruturais ao país, pactuaram com as classes populares e foram apeados do poder pelas oligarquias. Vamos agora para a Bolívia. O que dizer de Evo Morales, que é um indígena?

Balmaceda era filho de uma das famílias mais poderosas e aristocráticas do Chile. Sua gente tinha grandes fazendas. Já Salvador Allende descendia de um ramo de juízes, só que ele próprio era médico.Vinha de uma classe burguesa e propôs uma revolução contra ela. No caso boliviano, o presidente sob fogo cruzado é um indígena. Isso muda dramaticamente as coisas. Arrisco dizer que quando um membro de uma oligarquia “atraiçoa” os de sua classe, a resposta pode vir muito mais dura. Aconteceu com Balmaceda e Allende. O caso de Morales é muito original e está se produzindo num país peculiar, com diferenças intransponíveis entre a parte baixa, mais rica e branca, e o altiplano, mais pobre e indígena. Essa peculiaridade embute a idéia de separatismo.

Como Morales não é um traidor de classe, então, segundo seu raciocínio, teria chance de sair-se bem.

Morales não traiu sua gente. Mas tem sido um tanto contraditório. Às vezes é implacável, intransigente, às vezes, deliberadamente conciliador. Mesmo com as empresas estrangeiras ele é assim. Só que o feitio contraditório nem sempre ajuda. Também é preciso dizer que Morales, dos últimos presidentes bolivianos, foi o que levou mais longe as conversações com o Chile, sobre questões estratégicas de fronteira e a saída para o mar, herança da Guerra do Pacífico. Você poderia dizer que isso acontece porque ele se entende bem com Michelle Bachelet, pelo passado de esquerda da presidente. Mas hoje o chanceler chileno é um homem de centro-direita que se dá muito bem com Morales. Não há como negar: Evo Morales tem sido o mais negociador dos últimos presidentes bolivianos. Podemos ainda ter uma surpresa sobre sua capacidade de negociar. Eu já não diria o mesmo de Hugo Chávez.

Pode mesmo haver um golpe para derrubar Evo Morales?

Pode, mas dá para prever. Leve em conta que os militares, em situações como esta, tendem ao comportamento ambíguo. Eles não se metem num golpe na primeira hora. São cautelosos. Foi exatamente o que se deu com Pinochet, o último chefe militar a tomar a decisão de aderir ao golpe. Até o último momento, Allende achou que Pinochet era leal a ele e a seu governo. Pois quando o general aderiu, daí então foi duríssimo. Comportamento similar também pode ser atribuído a Franco, na Espanha. Militares são cautelosos e conspiram com discrição.

Grupos oposicionistas e mesmo os “comitês cívicos” que estão protestando na Bolívia agem fora da lei. Foram longe demais, ocupando empresas e vandalizando gasodutos?

Estão fora da lei e é isso que provoca o risco de uma situação de guerra civil. É um momento difícil. Você pode achar curioso como setores conservadores da sociedade boliviana apelam hoje para práticas radicais. Por outro lado, a aprovação da reforma constitucional, proposta por Morales, foi feita num Congresso que negou a participação da oposição. Produziram-se excessos por todos os lados e isso gera o quadro atual.

Em meio a tensões, Morales denunciou o embaixador americano como persona non grata. Disse que não se curvaria ao imperialismo americano. Já vimos isso na América Latina, não? Presidentes propõem mudanças na economia e no arcabouço legal dos países e acabam trombando com a potência.

É verdade. Balmaceda trombou com os ingleses no que chamamos de “imperialismo do salitre”. No século 19, o salitre era a riqueza chilena. Não havia sido descoberto o salitre químico, sintético; portanto, do salitre natural faziam-se fertilizantes e explosivos, o que era estratégico. Os ingleses controlavam praticamente toda a indústria do salitre no norte do Chile. Setores agrícolas, naquele momento, também se rebelaram contra as políticas de Balmaceda. Fez-se a poderosa união de forças entre os ingleses, os agricultores e a Igreja Católica, e não só em torno de interesses econômicos, pois Balmaceda também foi duramente criticado por pregar a laicidade do Estado. Por ter criado leis como a do casamento civil. Enfim, era um homem odiado pela direita católica. Já nos anos 70 do século passado, Salvador Allende enfrentou os americanos, no contexto da Guerra Fria. E hoje Evo enfrenta os interesses da geopolítica energética.

Qual a maior semelhança entre as crises do passado e as de hoje?

A questão do salitre foi detonadora da guerra civil chilena no final do século 19 e levou à derrocada de Balmaceda. Mas isso aconteceu justamente quando o Chile atravessava um momento de florescimento econômico. Hoje vivemos uma situação equivalente com o petróleo e o gás. Há perspectiva de enriquecimento de países em função desses recursos naturais, mas há também uma disputa mundial encarniçada por abastecimento energético. São interesses muito fortes. Ficamos sabendo que o embaixador americano na Bolívia foi afastado porque conspirava contra interesses do país. É bem possível que tenha conspirado mesmo, considerando o momento atual. Veja o que acontece na região da Geórgia, veja como se comportam os separatistas de lá. O que há por trás de todo o desentendimento com a Rússia? O petróleo. O oleoduto para transportar petróleo para toda a Europa Ocidental. A briga é essa. Você sabe o que o Chile está passando? O petróleo não está chegando aqui. Tampouco chega o gás, que teria de vir da Bolívia e da Argentina. Espero que Morales aja com prudência nessa crise, pois ela envolve outros países.

E as reivindicações dos indígenas? A nova Constituição, que ainda precisa ser referendada, assegura a eles maior representatividade, o que é contestado pela oposição.

É uma situação difícil de manejar. Supúnhamos que Morales, por ser indígena, saberia lidar melhor com o passivo indígena. Mas as dificuldades estão aí.

Nabuco, no famoso ensaio, falou dos “presidentes suicidas” do continente latino-americano. Ressaltou que tenderiam a perder oportunidades históricas. Essa reflexão pode ser aplicada à Bolívia de hoje?

Balmaceda queria usar o dinheiro do salitre para modernizar o país. Agiu rápido demais, foi inábil demais e acabou enfiando o Chile numa guerra civil terrível. Para se ter uma idéia da tragédia, foi um confronto com mais vítimas do que a Guerra do Pacífico, em que Chile se defrontou com Peru e Bolívia. Batalhas sangrentas, destruição generalizada, o país ficou aos cacos por muito tempo. Espero que não ocorra algo assim na Bolívia, que também vive um momento promissor na economia por conta do gás natural, que tem de sobra. Porém, falta dinheiro para investir no setor e os bolivianos precisam tratar bem os parceiros. De outro lado, o governo Evo Morales vem negociando bem com o Chile, como já disse. Porque a Bolívia precisa recuperar sua saída para o mar. É crucial. Pois bem, acaba de se decidir que será reconstruída a estrada de ferro ligando Arica e La Paz. Isso é esperançoso. Só que daí vem o pensamento grave de Nabuco, apontando nossa tendência a derrotas. A deixar escapar o momento histórico. Desgraçadamente esta sina pode se cumprir mais uma vez. Muito bem, não quero pensar o pior. A Bolívia já sofreu muito com golpes de Estado, prefiro confiar na astúcia de Evo Morales. Um golpe daria força ao discurso sobre um país “democraticamente inviável”, abrindo um precedente perigoso na América Latina. E um golpe de direita na Bolívia levaria a uma radicalização dos governos de esquerda na região. Mais radicalização e mais desconfiança. Isso não é bom.

O Brasil pode atuar como conciliador nesse momento?

Pode. O presidente Lula goza de credibilidade. Vem acumulando prestígio desde que chegou à presidência, sabe usar sua simpatia, olha os desafios com otimismo. Apesar de suas origens políticas, Lula não se compromete demais com a esquerda da América Latina.

O senhor passou por experiência semelhante à do embaixador americano na Bolívia. Também foi tido como persona non grata em Cuba, quando lá esteve como representante diplomático do governo Allende. Essa experiência deixou cicatrizes?

Eu não era embaixador. Naquele tempo, fui designado por Allende para abrir a embaixada chilena em Cuba, porque meu país não tinha relações diplomáticas com a ilha. Então, lá fui eu, como ministro plenipotenciário, abrir a embaixada. E lá fiquei, esperando a chegada do embaixador. Os problemas começaram pela minha dupla profissão. Eu já era diplomata e escritor. Isso não é raro, vocês tiveram casos assim no Brasil, como Guimarães Rosa, Vinícius de Moraes, João Cabral de Melo Neto. Nunca foi fácil juntar essas duas profissões. Quando cheguei a Cuba, tive uma conversa com Fidel Castro de três horas, privilégio que não aconteceria à maioria dos embaixadores europeus. No dia seguinte, voltamos a nos ver. Mais adiante tive um encontro que mudou minha visão sobre o regime castrista. Estive com Heberto Padilla, Lezama Lima e outros escritores importantes de Cuba. Alguns eram amigos meus, até trocávamos cartas. E o quadro que me trouxeram de Cuba era muito diferente do que fora pintado por Fidel. Isso me deixou numa situação difícil. Reconheci ali o dogmatismo stalinista. E o vi com clareza porque, afinal, minhas relações com a esquerda eram antigas. Os intelectuais eram controlados, censurados, perseguidos. Então meus problemas começaram. Certamente foi um erro nomear um diplomata-escritor para servir em Cuba. Mas foi dessa experiência que nasceu meu livro Persona Non Grata.

Quando escreveu o livro?

Esse episódio aconteceu quando Allende chegou ao poder, em 1970. Fui para Cuba, passei três meses muito difíceis e de lá me mandaram diretamente a Paris, para trabalhar com Pablo Neruda na embaixada chilena. Ele era o embaixador e fez de mim ministro-conselheiro, ou seja, deu a mim o segundo posto. Não posso reclamar de ter sido removido para Paris e para perto de Neruda. Quando cheguei, comecei a escrever o livro porque não queria esquecer o que tinha vivido. São memórias do meu período em Cuba.

O livro gerou mal-estar entre os dois países?

Não, porque o publiquei depois do golpe. Ele ficou na gaveta algum tempo.

Como foi trabalhar com o poeta?

Conhecia Neruda havia muito tempo. Mandei meu primeiro livro para ele em 1952. Eu era um rapaz de 20 e poucos anos. Depois, Neruda mandou me chamar e então desenvolvemos uma amizade que durou muitos anos. Foi ele quem pediu a Allende que me transferisse para Paris. Neruda sentia-se muito doente. Estava com aquele câncer que afinal o matou.

Onde o senhor estava quando houve o golpe militar no Chile? Em Paris?

Havia terminado minhas funções na embaixada em Paris e sai em férias. Estava numa pequena praia no sul de Barcelona. Depois do golpe, fui expulso dos quadros diplomáticos e me mantive na Europa. Voltei ao meu país seis anos mais tarde.

E quando falou pela última vez com Neruda?

Em novembro de 1972, ele decidiu regressar ao Chile e eu fiquei na embaixada. O câncer avançara muito. Partiu com a mulher, Matilde, para uma temporada em sua casa de verão na Isla Negra, perto de Valparaíso. Estava debilitado, eu sabia disso. A última vez que nos falamos foi por telefone, meses antes do golpe. Havia um único telefone em Isla Negra. Quando consegui falar com o poeta, foi incrível. Ele disse, brincalhão como sempre: “Vem para cá, homem, vem que o mar está lindo”. Foi a última vez que ouvi sua voz.

Novas vertentes do 'nunca antes'


Pedro S. Malan
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Um amigo bem-humorado comentou de passagem que o presidente Lula havia criticado fortemente todos os responsáveis pela política econômica “deste país” nos 20 anos que se lhe antecederam. No exterior, ocupado com outras coisas, considerei o fato apenas mais uma das incontáveis manifestações do “nunca antes jamais na história”, hoje definitivamente incorporado ao anedotário político do País. Nonada.

Mas, aparentemente, o que era uma pessoal marca registrada, patenteada pelo presidente Lula, está assumindo - e não apenas nos palanques - foros de um discurso oficial de uso mais amplamente disseminado. E assumindo novas vertentes. Por exemplo, a ministra-chefe da Casa Civil, a nova “capitã do time”, em discurso proferido na bela cerimônia comemorativa dos 40 anos da revista Veja, dez dias atrás, insistiu no fato de que o futuro do Brasil já chegou - e que este futuro começou com o governo Lula. As expressões “só agora”, “estamos começando” e “vamos começar” foram recorrentes - num discurso de dez minutos de duração.

É extremamente desejável que discursos políticos estejam voltados para o futuro. Mas o fato é que a capacidade de avaliar - e de responder a - riscos, desafios, incertezas e oportunidades (que o futuro sempre encerra) depende, em boa medida, da qualidade de nosso entendimento sobre os processos pelos quais chegamos ao sempre fugidio momento presente. É nesse sentido que a história é, e sempre será, um infindável diálogo entre passado e futuro. Algo que a litania do “nunca antes” procura, consciente ou inconscientemente, considerar irrelevante ou relegar ao mais simples de seus significados.

A propósito, cabe mencionar a meritória iniciativa do governo de comemorar, nesta última semana, os 200 anos de existência do Ministério da Fazenda (1808-2008) com a realização de um evento em Brasília para o qual foram convidados todos os ex-ministros da pasta ainda vivos. Não para um simples encontro social, mas para que cada um desse um depoimento franco sobre os principais desafios que teve de enfrentar em sua gestão. Algo civilizado. Um reconhecimento de que houve um “antes”: épocas em que o passado, hoje conhecido, ainda era um incerto futuro. Uma homenagem aos que aceitaram as responsabilidades do cargo, no qual procuraram servir ao País.

Pois bem, de volta do exterior, apenas no meio da semana tive oportunidade de ver matéria intitulada Lula chama antecessores na economia de criminosos, que reproduz trechos do “discurso” presidencial proferido em Ipojuca (PE) para um público de metalúrgicos. Bem sei que em palanques, com audiências cativas, políticos tendem a se deixar levar por emoções, por arroubos retóricos e pelo calor da hora. Mas o presidente disse, textualmente, que um indivíduo preso porque cometeu um delito “é menos criminoso do que aqueles que foram responsáveis pela política econômica e pela política de desenvolvimento deste país nos últimos 20 anos” (Folha de S.Paulo, 6/9).

Esta é uma nova vertente do “nunca antes”. Agora não é apenas o passado em geral que se procura acusar. Agora são pessoas que têm nome e biografia conhecidos que são tachadas de criminosas com insensata ligeireza. Como dizem os cariocas, “menos presidente, menos”. Afinal, os “últimos 20 anos” incluem os governos de cinco ex-presidentes e daqueles que lhes serviram - e ao País - como “responsáveis pela execução da política econômica e da política de desenvolvimento”. Se considerarmos todos os ex-ministros da Fazenda e do Planejamento (e presidentes do Banco Central), estamos falando de várias dezenas de pessoas. Todos “criminosos”, presidente?

Tenho certeza que nosso presidente, no fundo, não acha realmente isso e reconhece que a metáfora talvez tenha sido particularmente infeliz. Afinal, foi o mesmo presidente, em discurso feito em Massaranduba (BA), em março de 2006, que afirmou: “É possível fazer política de forma civilizada.” E eu realmente prefiro acreditar no Lula de Massaranduba do que no Lula de Ipojuca. Dúvidas excessivas sobre qual é o verdadeiro Lula, ou percepções de que a resposta é “ambos”, poderiam levar alguns a endossar a observação de Ferreira Gullar: “Ele diz qualquer coisa a qualquer hora, depende do público que o assiste e da conveniência do momento.”

E chego aqui ao que efetivamente importa, no momento e nos próximos anos. Fica e ficará cada vez mais claro que o contexto internacional mudou desde fins de 2007 e que a economia mundial será menos favorável, mais turbulenta, mais volátil e, certamente, crescerá menos nos próximos dois anos em razão da grave crise de confiança que ora assola o sistema financeiro e os mercados de crédito do mundo desenvolvido.

Não tenhamos dúvidas de que seremos afetados enquanto esta crise estiver seguindo seu curso, que não será de curta duração. Mas, como toda crise, será resolvida um dia - ainda que a um custo não trivial. E também, como toda crise, oferece oportunidades não só a empresas, como a países que não se deixam levar por excessos de complacência e auto-indulgência derivados de vários anos de desempenho favorável.

Mais uma razão para um sereno olhar à frente. Se os ventos que sopram do exterior se tornam menos favoráveis, há que avançar mais - e não menos - na consolidação e ampliação de mudanças estruturais e avanços institucionais e no compromisso firme com políticas macro e microeconômicas consistentes. O Brasil está excepcionalmente bem posicionado para aproveitar as oportunidades que crises como esta, e sua superação, sempre encerram.

Um país que, exatamente porque está com os olhos firmemente postos no futuro, não perde tempo com discussões estéreis, falsos dilemas e insensatas condenações a esforços passados. Sem ajuda dos quais seu sucesso atual e suas promissoras possibilidades futuras simplesmente não existiriam na configuração de hoje.

Pedro S. Malan, economista, foi ministro da Fazenda no governo FHC

EUA e AL


Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


NOVA YORK. A América Latina nunca teve uma prioridade na agenda da política externa do governo dos Estados Unidos, e os dois candidatos atuais não destoam desse quadro geral. O republicano John McCain tem mais projetos do que o democrata Barack Obama, e os republicanos ainda têm direito a serem identificados como menos protecionistas do que os democratas, mas essa diferença fica cada vez menos nítida diante da crise econômica que assola o país. No mais recente número da revista de política internacional Foreign Affairs, Jorge G. Castañeda, ex- ministro das Relações Exteriores do México e hoje professor da Universidade de Nova York, lembra que o tratado de livre comércio com a Colômbia, um parceiro especial dos Estados Unidos na região, ainda não foi votado pelo Congresso democrata e possivelmente não o será até o final do governo Bush.

Castañeda coloca entre as tarefas prioritárias do próximo presidente dos Estados Unidos em relação à América Latina, ao lado da abertura comercial, o reforço aos governos de esquerda que chama de "moderna, democrática, globalizada e adepta das leis do mercado", como o de Lula no Brasil, o de Michelle Bachelet no Chile, o de Tabaré Vasques no Uruguai, em contraposição a uma esquerda "retrógrada, populista, autoritária e antiamericana" encarnada por Hugo Chávez na Venezuela, Evo Morales na Bolívia, Rafael Correa no Equador, Raul Castro em Cuba, entre outros.

É essa esquerda que transita em torno do projeto político de Chávez que está mais uma vez envolvida em uma crise política na região, situação de conflito que já estava caracterizada desde quando o governo venezuelano passou a ter ascendência política e financeira sobre diversos outros governos da região, e não apenas a Bolívia de Evo Morales.

Fortalecido pelo aumento do preço do petróleo, ele atua em dois momentos: no ideológico, e também com a diplomacia do petrodólar, como no caso da Argentina, comprando os bônus argentinos e enviando malas de dinheiro para as campanhas políticas, e também a sustentação financeira de Cuba.

Já se disse que os petrodólares de Chávez substituem o "ouro de Moscou" do tempo da Guerra Fria, fazendo com que seu peso político se torne desproporcional à sua real importância geopolítica na região.

A forma como Chávez tem agido, no entanto, só vem a reforçar a imagem de Lula como um líder equilibrado em uma região conturbada. O país tem vários projetos que neutralizariam a influência venezuelana, mas encontra resistências no próprio bloco.

Além do Mercosul, de teor mais econômico, o Brasil tenta colocar de pé uma Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa), que seria o braço político da união regional. Em outra frente, o Ministério da Defesa negocia a coordenação das políticas de defesa do continente, Conselho Sul-Americano de Defesa, que seria responsável por uma estratégia regional conjunta.

Os argentinos reagem à criação da Casa, convencidos de que enfraqueceria o Mercosul, e a Venezuela, que tem um projeto de união das forças militares da região, deve ser um obstáculo ao projeto brasileiro de defesa regional, que mitiga o lado belicoso do projeto "bolivariano".
Em meio a um ambiente de hostilidades crescentes, a política de armamento da Venezuela acendeu o alerta em setores militares brasileiros, e o reequipamento das nossas Forças Armadas passou a estar na ordem do dia. No plano internacional, o namoro entre Chávez e Putin e Chávez e Ahmadinejad só faz ampliar as áreas de conflito com os Estados Unidos.

Mesmo que se tratem apenas de bazófias, o convite para que a Rússia participe de manobras militares como acontece agora, ou tenha uma base militar na Venezuela, e a proposta para um programa comum de energia nuclear com o Irã, ao mesmo tempo em que a Venezuela compra armamentos militares, faz com que o clima político na região esteja sempre efervescente.

E não por acaso os Estados Unidos recriaram a 4ª Frota nos mares da região, provocando reclamação generalizada, vocalizada pelo governo brasileiro. Clóvis Brigagão, diretor do Centro de Estudos das Américas da Universidade Candido Mendes, acha que tudo isso leva a pensar "que a crise vai se agravar, os limites de negociação se estreitam e que algum tipo de manobra de desestabilização política na Bolívia surgirá diante de tantos fracassos e exacerbações radicais de cada lado, tanto internas como externas".

Quanto à propalada tentativa do governo Bush de participar de um golpe contra Morales, Brigagão duvida, "embora o legado americano não seja desconsiderável ao longo da nossa história". A troca de insultos e a expulsão dos embaixadores em La Paz e em Washington "não inspiram uma posição conciliatória de ambos os lados", analisa Brigagão, para quem a atitude de Chávez é recorrente, uma série de provocações bem ao seu estilo.

Segundo ele, o Brasil "deve e pode mediar toda essa trapalhada, mas permanece ambíguo em termos de ter dado apoio incondicional a Morales durante todo o desenrolar da crise e, ao mesmo tempo, sofre todas as pressões por parte dos governadores da Meia Lua, principalmente o de Santa Cruz - que ameaçam cortar a transferência do gás para o Brasil, fecham as fronteiras, podem vir a ameaçar agricultores brasileiros que vivem na Bolívia".

Além de uma efetiva atuação de emergência por parte do Grupo de Amigos, formado por Brasil, Argentina e Colômbia, Clóvis Brigagão acha que deveria ser convocada uma reunião de emergência do Conselho de Ministros de Relações Exteriores dos estados membros da OEA, do Grupo do Rio, para "desfazer a potencial crise entre Bolívia e EUA, isolar a posição de Chávez, definitivamente, se isso é possível diante da virulência como está sendo processada a atual crise".

Tempos modernos


Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


A linha de produção de Charles Chaplin no filme que nos empresta o título remete a mente à associação com os repetitivos movimentos eleitorais de candidatos - entra disputa, sai disputa -, independentemente do que realmente pensam ou como de fato são.

O sentido é o mesmo: Chaplin apertava parafusos mecanicamente e os pretendentes a cargos eletivos reproduzem feito autômatos as regras ditadas pelo chamado marketing político, transferindo aos publicitários o comando das respectivas personalidades.

Com isso, ganham-se eleições, é verdade. Mas com o abuso disso também se esteriliza a política, subtrai-se do eleitor a prerrogativa de raciocinar, retira-se do debate a sua essência - o contraditório oriundo do embate de convicções genuínas -, forma-se uma geração de políticos sem espontaneidade e de eleitores regidos pelo previsível.

Dada a ampla aceitação da receita na condição de cláusula pétrea do modo contemporâneo de pôr uma campanha na “rua”, não há, tão cedo, o menor perigo de prevalecer a tão reclamada empolgação, muito menos o celebrado embate de idéias.

Aliás, conflito de espécie alguma. A não ser os improdutivos confrontos de “sacadas” cuidadosa e previamente elaboradas por sabidos muito bem remunerados para adaptar a oferta verbal e/ou gestual do contratante à demanda auditiva e/ou sensitiva do futuro votante.

Resultado: a diferenciação entre candidatos se faz pelas respectivas posições nas pesquisas, pela produção mais ou menos elaborada dos programas de rádio e televisão, e pela quantidade de minutos disponíveis para cada um.

Quando estão todos juntos num debate, por exemplo, não há quase como distingui-los a não ser pela voz, figurino e fisionomia. Nesta seara os especialistas já entraram, mas ainda não a ponto de lhes anular por completo as identidades.

Mas, no ritmo da carruagem em curso, ainda haverão de conseguir transformá-los em clones do modelo mais adequado ao presumido gosto do eleitorado, extraído da média de opiniões dos grupos de pesquisas “quali”.

Antes que se argumente que o Brasil apenas importa métodos modernos aplicados em democracias avançadas, convém convidar o leitor a apreciar debates de candidatos americanos ou europeus acessíveis em canais a cabo.

Nada nem de longe parecido com o monumento em homenagem a Morfeu que os nossos arquitetos de candidaturas e uma legislação defensiva impõem às emissoras.

Lá, os temas são postos à mesa e os oponentes discutem, discordam, são dura e detalhadamente questionados, participa quem realmente está no páreo e a coisa flui. De maneira interessante ou desinteressante, dependendo dos atributos dos debatedores.

Aqui o candidato pode ser um gênio da comunicação, que estará sempre engessado num cipoal de regras cujo objetivo é justamente impedir que a coisa flua.

A começar pelo burríssimo respeito ao princípio da isonomia, que assegura presença e tratamento igual a todos, sejam porta-vozes de forças representativas, representem só a si ou estejam a serviço de interesses outros.

Poucas cenas são mais ridículas do que assistir a um desses arrivistas apresentando seus “planos de governo”. Talvez a correria dos competitivos para enquadrar suas falas aos minutos preestabelecidos no manual seja pior.

Ninguém compreende nada a respeito de coisa alguma, nada é explicado nem cobrado. Qualquer passo fora do esquema pode suscitar um “pedido de resposta” ou, vexame dos vexames, uma descompostura por parte do mediador, pressionado pelas equipes sempre vigilantes nos bastidores.

Quando o dito debate acaba, restam apenas vagas impressões sobre as performances de cada um e quem tiver a sorte de produzir alguma “tirada” é visto logo como o vencedor da discussão. Inexistente, note-se.

Para agravar a apertura das ataduras, os políticos elaboraram regras eleitorais que simplesmente inviabilizam o exercício do contraditório nos meios eletrônicos, onde estão vetados comentários de opinião e/ou interpretação a respeito das campanhas e dos candidatos.

É difícil precisar o momento em que as campanhas eleitorais tomaram esse rumo. Na verdade não houve um instante, mas um processo defensivo fruto da exacerbação do medo de errar em substituição à vontade de acertar.

O candidato, então, não se apresenta livre, ousado, em risco, na plenitude de sua espontaneidade ao eleitor. Não expõe idéias novas, não cria, não seduz, não encanta, deixando essa tarefa nas mãos do marqueteiro.

Prova? A idéia praticamente consensual de que a responsabilidade pelo melhor ou pior desempenho do candidato seja do profissional responsável pela embalagem do produto. Como se a troca do embrulho alterasse a qualidade do conteúdo.

Aceita a premissa deformada, nada mais parece estranho. Nem um candidato desprovido de atributos, de patrimônio eleitoral, de projetos factíveis, compreensíveis e verossímeis, nem a eleição de um poste bem enfeitado.

E agora, José?


Nas Entrelinhas :: Luiz Carlos Azedo
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE

As eleições municipais apontam para uma vitória maciça dos governistas, principalmente do PT e do PMDB, mas a oposição não será varrida do mapa

Nunca antes a oposição ao governo Lula foi tão ignorada. Apenas 8% dos brasileiros consideram o governo ruim ou péssimo, segundo a última pesquisa DataFolha. Para 28%, é regular. A ampla maioria avalia o governo como bom ou ótimo: 64%. Já não é a população de baixa renda que deu as costas aos que criticam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A opinião pública, formada a partir das camadas mais cultas e de maior poder aquisitivo, também se descolou da oposição.

A economia

A elite culta e endinheirada vai muito bem, obrigado, e deixou os preconceitos de lado. O desempenho da economia, as políticas sociais e o programa de investimentos em obras públicas respondem por tanto sucesso do governo. A inflação está sob controle; o crescimento, bomba. Lula capitaliza os feitos de seu governo com maestria, mesmo aqueles cujos resultados só virão a médio e longo prazos, como a perfuração do primeiro poço exploratório do pré-sal no litoral capixaba. Com as mãos sujas do “ouro negro”, Lula redescobriu o petróleo no Brasil. É um craque do marketing político.

Os prognósticos catastróficos em relação aos reflexos da crise norte-americana e da recessão européia no Brasil até agora não se confirmaram. As previsões de que a alta da taxa de juros provocaria baixo crescimento, também não. A expansão do consumo de massas e do mercado interno, na contramão da crise na economia mundial, amarraram por baixo o nosso dinamismo econômico. O risco é a falta de infra-estrutura para crescer provocar inflação. Nesse aspecto, a taxa de juros funciona como freio de arrumação. É uma questão de pragmatismo.

A política

Será que a oposição se tornou irrelevante no Brasil? Para a maioria da população, sim; para a democracia, não. Para contê-la, foi preciso o presidente Lula fazer um segundo mandato melhor que o primeiro. Basta olhar a composição de seu ministério. É mais robusto que o anterior, a começar pelo estado-maior do Palácio do Planalto, que se livrou da luta interna do PT e passou e emular com a oposição. A formação do governo de coalizão, com a participação do PMDB, lhe deu mais estabilidade institucional e sustentação política. Lula se compôs com algumas oligarquias regionais, porém sua base social foi enraizada nas camadas mais pobres da população do Norte e do Nordeste.

O intervencionismo econômico do governo e a ampliação do Estado brasileiro atraíram os apoios das camadas medias urbanas e das elites econômicas. Funcionam com pista dupla; uma, à esquerda, resgata o discurso nacional-desenvolvimentista; outra, à direita, serve de plataforma para os grandes negócios na mineração, siderurgia, telefonia e energia, principalmente. Nesse cenário, a oposição fala para menos de 10% da população, uma parcela que se opõe ao governo por razões ideológicas, corporativas ou muito localizadas. Esse é o gueto político em que corre o risco de se aprisionar, num momento em que o país encerra um ciclo político. E começa outro, cuja agenda está sendo delineada por tarefas que Lula herdou e não cumpriu, como a redução dos juros. E por contradições que agravou, como a expansão da carga tributária.

A oposição

Isso significa que todos devem aderir ao governo porque a sucessão em 2010 será decidida por um “dedazo” do presidente Lula em favor da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT)? Longe disso. Tal unanimidade seria “mexicanizar” a democracia brasileira. E a tese do terceiro mandato, alimentada por setores petistas? Para alguns, já não depende da correlação de forças, mas de uma posição de princípio do PT ou da vontade do presidente Lula. Não é bem assim. Mesmo com o Congresso e ao Supremo Tribunal Federal (STF) submetidos a sucessivos desgastes, sua aprovação cedo ou tarde levaria o país a uma crise institucional. Basta olhar para a Venezuela e a Bolívia, nossos vizinhos.

As eleições municipais apontam para uma vitória maciça dos governistas, principalmente do PT e do PMDB, mas a oposição não será varrida do mapa. Submergiu no plano local, não conseguiu avançar nos espaços governistas, porém tem chances de manter as posições onde fez boa administração. Com a a oposição acuada, a campanha eleitoral alavancou ainda mais a avaliação positiva do governo. Lula é a grande estrela do horário eleitoral. Em São Paulo, está em curso uma dramática guerra de posições para a sucessão de Lula, tanto na capital como nas grandes cidades do interior. Se a oposição for derrotada, a candidatura do governador José Serra (PSDB) a presidente da República estará em xeque. O tucano precisa de uma grande vantagem pelo eleitorado paulista para manter seu favoritismo às eleições de 2010.

Bons prefeitos, bons candidatos

Marcos Coimbra
Sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi
DEU NO ESTADO DE MINAS


De Norte a Sul, quem vai bem nas eleições são os prefeitos, de todos os partidos
Quando chega a reta final das eleições, começa a procura do que seriam seus traços gerais, dos aspectos que os diversos pleitos que as compõem compartilhariam. Isso apenas antecipa algo que vira mania quando terminam, a identificação de seu “significado” mais amplo, aquilo que se costuma chamar “recado das urnas”.

É uma tarefa inglória, especialmente quando as eleições são municipais. Embora seja uma busca à qual se dedicam com afinco os profissionais da política, seja na atividade propriamente política, seja na imprensa ou na academia, tentar encontrar um sentido único, um mesmo “recado” de mais de 5 mil eleições diferentes, raramente leva a qualquer conclusão relevante. O máximo que se consegue, à custa de muita abstração, é chegar a meia dúzia de trivialidades, do gênero “o eleitor brasileiro está insatisfeito”, “quer mudanças”, etc.

Estamos vendo agora uma tese desse tipo a respeito das eleições deste ano, quando ainda falta quase metade do período de propaganda eleitoral pela televisão. Mesmo percebendo quanto as intenções de voto sofreram seu efeito nas primeiras semanas, tem gente correndo para descobrir o que “querem dizer” os números de hoje, sem esperar sequer pelos de amanhã.

É a tese da “onda vermelha”, elaborada a partir das pesquisas que mostram que muitos candidatos do PT vão bem e estão crescendo. As principais evidências provêm do Nordeste, de Fortaleza e Recife, sem esquecer do desempenho acima do esperado de Marta Suplicy.

De fato isso acontece, mas daí a deduzir que uma “onda vermelha” está se formando, há uma grande diferença. Deixando de lado a situação de São Paulo, os casos mencionados talvez tenham mais a ver com outra coisa, essa sim geral. Aliás, com o único traço destas eleições que pode se candidatar a ser seu “significado”.

O que ocorre em Fortaleza e Recife é mais que o favoritismo de candidatos do PT, pois o mesmo está em curso país afora e não é restrito às candidaturas dos integrantes do partido de Lula. De norte a sul, quem vai bem nas eleições são os prefeitos, de todos os partidos.

Nos casos óbvios em que disputam a reeleição, em quase todas as cidades para as quais dispomos de pesquisas, eles ou elas estão na frente. Onde faziam um trabalho bem-avaliado, mas de pequena visibilidade, cresceram. Faltava-lhes, ao que parece, apenas comunicação.

Com a enorme mídia que nossa legislação oferece aos candidatos, isso se resolveu em poucos dias. Alguns que estavam em terceiro ou quarto lugar saltaram para o primeiro, como em Fortaleza. Até quem era considerado carta fora do baralho, como o prefeito de Salvador, voltou a ser competitivo. Quem estava com imagem desvitalizada rejuvenesceu, como o prefeito de Porto Alegre. O prefeito de São Paulo passou a ser sério contendor.

O mesmo vale para os candidatos pouco conhecidos que são apoiados por prefeitos bem-avaliados. O pulo à frente dos candidatos dos prefeitos de Recife e Belo Horizonte é evidência disso, no segundo caso ainda maior pelo fato de Aécio também apoiar Marcio Lacerda. Quanto aos prefeitos mal-avaliados, pouco conseguem fazer por seus candidatos, como acontece no Rio.

Quem era bem avaliado e fazia boa comunicação está atravessando a eleição voando em céu de brigadeiro. Pergunte-se ao prefeito de Curitiba se tem alguma preocupação, a esta altura.

Em cidades médias e menores, coisas parecidas acontecem. Bons prefeitos do PMDB, do PSDB, do DEM, do PSB, de todos os partidos, vão bem, incluindo os do PT. Se há uma onda, é a onda dos prefeitos.

Quanto a São Paulo, muito do favoritismo de Marta tem a ver com a política que fazem seus adversários. O governador José Serra pode explicá-lo. Tampouco lá, a onda é vermelha.

Lula ajuda Kassab


Clóvis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - A afirmação que dá título à coluna é puro palpite, mas me animo a fazê-la. E a explicar:

1 - O Brasil vai bem. Muito menos do que eu gostaria, mas minha opinião conta pouco ou nada.

2 - Cria-se, pois, o que os ingleses chamam de "feel good factor", o fator sentir-se bem.

3 - Não parece razoável acreditar que o eleitor separe totalmente o "sentir-se bem" em "sentir-se bem federal, estadual e municipal". Sente-se bem e ponto.

4 - Logo, devolve essa sensação positiva afirmando a intenção de votar nos governantes que considera responsáveis por sentir-se bem ou nos candidatos apoiados por esses governantes.

Nesta eleição, prefeitos em geral beneficiam-se desse fator, salvo que sejam um desastre. Ajuda, óbvio, o fato de que o prefeito Gilberto Kassab é o queridinho de outro governante, José Serra, embora não seja o candidato oficial do governador.

5 - Claro que também ajuda o fato de que o paulistano declare sentir-se bem com a cidade, como prova a avaliação de Kassab. Para o meu gosto, São Paulo continua tão inóspita quanto nos últimos muitos anos, mas, de novo, meu gosto conta pouco ou nada. Dá, então, para fechar o teorema afirmando que Kassab vai para o segundo turno e, nele, ganha de Marta Suplicy? Não.

O sentir-se bem espalha suas benesses também sobre Marta, que todo mundo sabe que é "o lado" de Lula, como o presidente já declarou. Aliás, é esse fator que explica porque, nesta eleição, há um empate entre Marta e a soma de intenções de voto no tucano e no demo, ao contrário dos dois pleitos anteriores, em que Serra surrou Marta e Geraldo Alckmin folgou contra Lula (na capital).

No turno final, o desempate dependerá, ao menos em parte, de o sentir-se bem ser mais federal ou mais estadual/municipal.

A oposição acabou?

Adriana Vasconcelos
DEU EM O GLOBO

Popularidade recorde de Lula, aliada ao bom desempenho da economia, inibe ação de partidos contra o governo

BRASÍLIA. "Saiu de moda fazer oposição no Brasil". O desabafo feito semana passada pelo senador Sérgio Guerra (PE), presidente do PSDB, maior e mais importante partido de oposição ao governo Lula, dá a noção exata da angústia dos que se dispõem a essa tarefa hoje no país. Cientistas políticos reconhecem a dificuldade em se contrapor a um presidente que bate recordes de popularidade - segundo pesquisa Datafolha divulgada sexta-feira, ele conta com a aprovação de 64% dos brasileiros.

Eles afirmam, porém, que nem por isso a oposição corre o risco de acabar, e ressaltam que a adesão em massa à situação não é privilégio apenas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. É um cenário que se repete em muitos estados.

- Realmente, o caminho da oposição tem sido muito árduo. Isso porque os modelos de gestão são muito parecidos, e a oposição, quase sempre, tem muito pouco a inovar. Mas ela sempre vai ter o seu lugar - aposta o professor de ciência política da PUC de Minas Gerais Malco Braga Camargo.

"Diante de governos bem avaliados, soa mal criticar"

Na sua opinião, o quadro se repete em alguns estados até com intensidade maior. Minas é um exemplo disso, onde o governador tucano Aécio Neves, assim como o presidente Lula, tem o apoio de uma ampla base política, e a oposição ao seu governo é praticamente inexistente. Na capital, Belo Horizonte, não é diferente, e verifica-se que há pelo menos 16 anos o mesmo grupo político, integrado pelo PT, se reveza na prefeitura.

- Diante de governos bem avaliados, soa mal para a oposição criticar o poder vigente, tanto que na maior parte das campanhas eleitorais hoje no país os candidatos disputam para ver quem incorpora melhor a continuidade da situação - acrescenta Camargo.

O cientista político David Fleisher, da Universidade de Brasília (UnB), considera exagerado o desabafo de Guerra. Mas reconhece que a satisfação da população com a economia favorece os candidatos identificados com o governo Lula:

- O governo tem formatado vários projetos que deixaram a economia bombando. Isso aumenta a sensação de satisfação do eleitor e deverá ter um impacto nas eleições municipais. Entre os candidatos que estão liderando a disputa nas 26 capitais, 20 são de partidos da base governista. E entre os seis de oposição, há candidatos, como a do PV em Natal, Micarla de Souza, que diz que seu partido pode até fazer oposição ao presidente Lula, mas ela não. Ou seja, menos uma na oposição.

Mais do que pertencer ao PV - dividido em relação ao governo Lula -, Micarla disputa com apoio do DEM, o segundo maior partido de oposição a Lula, para se contrapor à candidata do PT, Fátima Bezerra. Ainda assim não faz oposição ao presidente.

Animado com o desempenho dos candidatos da base, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) prevê uma vitória "estrondosa" de seu partido e dos aliados nas eleições municipais e aproveita para alfinetar os poucos adversários que insistem em se opor ao governo Lula. Em São Paulo mesmo, segundo ele, o PSDB só lidera a disputa em dois municípios (entre os grandes), Piracicaba e Sorocaba.

- Nós (do PT) demoramos para nos tornamos uma oposição competente. A oposição precisa ser programática. Não há mais espaço para aventureiros nem oportunistas que torcem para o quanto pior melhor. O povo está feliz e é situacionista - ensina Mercadante, que muitas vezes viu seu partido, quando oposição, ser acusado de torcer para o "quanto pior melhor".

Ex-ministro de Lula, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) lamenta que a imensa capacidade de aglutinação do presidente tenha feito recuar o nível de consciência política no país:
- Não dá para negar que o presidente Lula avançou com mais competência do que o anterior, mas sua capacidade de aglutinação representa hoje um retrocesso no nível de consciência do país. Os anos Lula serão lembrados como anos de silêncio intelectual.

Resistência maior a Lula ainda vem do Senado
Mas é no Senado hoje, na avaliação de Fleisher, onde ainda há a mais forte resistência:

- A oposição no Senado tem número suficiente para impedir a aprovação de emendas constitucionais. Foi assim que conseguiu derrubar no ano passado a prorrogação da CPMF.

Além de não garantir maioria folgada a Lula, o Senado tem os oradores mais críticos. Ainda que concorde com Guerra, que diz que "a oposição no Brasil foi revogada, saiu de moda", o também tucano Arthur Virgílio (AM) não dá trégua a Lula. Semana passada, cutucou Lula sobre o marketing que ele faz em torno Pré-Sal, e o escândalo dos grampos, quando disse que a Abin "não pode virar uma SS sem Hitler". Revezam-se com ele, na tribuna, Álvaro Dias (PSDB-PR) e Heráclito Fortes (DEM-PI). Mas, em tempos de campanha, os ataques diminuíram.

"Fortuna" e "virtù"

Editorial
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Recorde na popularidade de Lula reflete bonança na economia que seria injusto atribuir apenas à sorte presidencial

CRESCIMENTO econômico, redução da desigualdade de renda, controle da inflação. Uma rara confluência de fatores positivos se reflete no recorde histórico alcançado pela popularidade do presidente Lula, segundo a última pesquisa do Datafolha: 64% da população qualifica como "ótimo" ou "bom" o seu governo.

Lula tem muito a agradecer, por certo, ao concurso da "fortuna" -e a descoberta de grandes reservas de petróleo no oceano, abaixo da camada de sal, parece mais uma vez confirmar no seu caso a intervenção desse fator imponderável, que Maquiavel apontava como essencial para o sucesso de um governante.

Essencial, mas insuficiente, segundo o autor de "O Príncipe", se não vier acompanhada da "virtù". Noção difícil de definir, mistura de audácia e de oportunismo, de cálculo e de instinto, não faltaram ao presidente condições de demonstrá-la.

O que talvez mais surpreenda em Lula é que sua "virtù", no Planalto, em nada se confunde com as características que alardeava enquanto líder partidário. O que aparentasse possuir de coerente, de inflexível, de "diferente", deu lugar a uma adaptabilidade cautelosa, feita menos de indignação mudancista que de conformidade com o mundo real.

Essa conformidade, de resto, foi o que lhe permitiu resistir às pressões no sentido de alterar os rumos adotados na política econômica sob FHC. Lula teve o mérito de contribuir para um ambiente de segurança econômica que, antes de sua posse em 2002, nenhum observador se dispunha a prognosticar.

A crise do mensalão, a que reagiu com mediocridade, teve o efeito paradoxal de desvinculá-lo definitivamente da tutela partidária; fortaleceu-se com o tempo a imagem de um presidente pairando acima das instituições, de forte identificação popular, no velho estilo varguista.Sem dúvida, a hábil conivência com o atraso político constitui um aspecto decisivo na sustentação de Lula, tanto no Congresso quanto nas camadas que mais se beneficiaram de sua investidura como um novo "pai dos pobres". Destituído de qualquer audácia no sentido de promover reformas institucionais profundas, o presidente fez, nesse campo, da inação sua "virtù".

O populismo, a tentação autoritária e continuísta, a cisão da sociedade em duas metades inconciliáveis, têm sido uma constante na América Latina; casos como os da Venezuela e da Bolívia, nos dias de hoje, reiteram essa maldição histórica.

Alcançando, pela primeira vez, setores populacionais de maior renda e escolaridade, a aprovação de Lula parece entretanto afastar-se do esquema arquiconhecido; fundamentos econômicos mais sólidos, além de uma maturidade institucional mais nítida, tendem a colocar o país diante de expectativas menos sombrias. Desde que o permitam, por certo, a "fortuna" e a "virtù" -não as de um presidente, mas sim as de todos nós.

A aprovação de Lula

Editorial
DEU NO ZERO HORA (RS)

A expansão da economia e os efeitos sociais dos programas de distribuição de renda estão sendo vistos como as causas principais de um fenômeno de popularidade inédito no país: segundo pesquisa do Instituto Datafolha, o presidente Lula registra a maior aprovação popular de um governante desde a redemocratização do país. Nada menos que 64% dos brasileiros aprovam seu governo. O prestígio presidencial surfa numa onda de características positivas e de coincidências promissoras. A economia do país, estabilizada há mais de uma década e disciplinada por uma série de leis da chamada reforma institucional, devolve finalmente em crescimento aparentemente sustentável o esforço que a sociedade fez para domar a inflação e para sanear as contas públicas. A explicação para o prestígio recorde do presidente pode ser encontrada também nos desdobramentos sociais dos programas de distribuição de renda, em especial o Bolsa-Família, que são responsáveis diretos pela retirada de milhões de brasileiros da linha da pobreza. No Nordeste, região que é a maior beneficiária desse programa, a aprovação do presidente é a maior do país, chegando a 75%.

Ao analisar a ascensão brasileira à primeira linha do protagonismo mundial, a mais recente edição da revista The Economist saúda o Brasil como “uma superpotência econômica, e agora em petróleo também”. A revista, que está entre os veículos de informação mais influentes do mundo, atribui o bom momento brasileiro a três fatores recentes: o controle da inflação, o fim da dívida externa e a democratização. E responde a uma das questões que têm inquietado os brasileiros que não entendem por que nosso país não consegue expandir seu PIB nos níveis em que o fazem a China e a Índia, por exemplo. Para The Economist, a comparação do que ocorre em nosso país com os padrões chineses é indevida e equivocada por um motivo singelo: o Brasil já cresceu nesse ritmo nas décadas de 50 e 60. O crescimento de um país de expressiva classe média, como é o Brasil de hoje, é menos meteórico e precisa ser mais sustentável.

A popularidade do presidente, alicerçada nos resultados positivos da economia, alcançou pela primeira vez todos os segmentos sociais, mesmo os que tradicionalmente lhe eram críticos. A pesquisa lhe dá apoio majoritário no Sudeste (57%) e no Sul (60%), nas regiões metropolitanas (57%), entre os que têm curso superior (55%) e entre os que vivem em famílias com renda familiar mensal superior a 10 salários mínimos (57%). Essa condição inédita não deve ser motivo apenas para comemorações. Com esse respaldo político, o presidente tem o dever de agir com grandeza e sabedoria para adotar medidas, mesmo impopulares, tendentes a romper com as mazelas sociais e políticas que o Brasil mantém, aprimorar a qualidade da democracia e enfrentar os gargalos infra-estruturais. O prestígio popular não pode ser visto como uma carta branca, mas como a confirmação informal, mas nem por isso desimportante, de um mandato a ser exercido para e pelo país.

SIGNIFICADO

O prestígio popular não pode ser visto como uma carta branca, mas como a confirmação informal, mas nem por isso desimportante, de um mandato a ser exercido para e pelo país.

O que pensa a mídia

Editoriais dos principais jornais do Brasil
http://www.pps.org.br/sistema_clipping/mostra_opiniao.asp?id=1086&portal=